Chuva, lágrimas e um exercício de cidadania

Embalados por um carro de som e uma bandinha tradicional, centenas de funcionários públicos marcharam pelas ruas do centro da cidade com faixas e bandeirinhas nas mãos, para pressionar os governos municipal e estadual a pagar dívidas trabalhistas.

Vestindo camisetas brancas com a inscrição Precatório alimentar: Pagamento já!, centenas de servidores ouviram atentamente, no dia 28 de novembro, os discursos de representantes da categoria em frente à Faculdade de Direito do Largo São Francisco, no centro da cidade. De cima de um carro de som parado sobre a calçada, José Gozze, presidente da Associação dos Servidores do Tribunal de Justiça, após informar que cerca de 25 mil servidores já morreram sem receber seus precatórios, puxou um coro, em tom de protesto. Ao seu grito de “Precatório alimentar”, os servidores respondiam com um “Pagamento já! Pagamento já!” Nem mesmo a chuva fria que aparecia de tempos em tempos foi capaz de dispersar o grupo. Como se formassem uma única voz, eles continuaram a entonar seu “grito de guerra”, apenas substituindo as bandeirinhas que balançavam de um lado para o outro – e cuja mensagem era idêntica à de suas camisetas – por guarda-chuvas de diferentes cores, tamanhos e modelos.

OAB e Madeca

Felippo Scolari, presidente do Movimento dos Advogados em Defesa dos Credores Alimentares do Poder Público, Madeca, conclamou os servidores a responder – em alto e bom som – à seguinte pergunta: “O que a prefeita e o governador do Estado são?” “Caloteiros! Caloteiros!”, respondiam, com energia, os servidores. Antes de passar o microfone para Flávio Brando, o presidente da Comissão de Precatórios da OAB, Scolari lembrou que os advogados lutaram e venceram as batalhas judiciais em todas as instâncias, inclusive no Supremo Tribunal Federal (STF). Tão entusiasmado quanto o presidente do Madeca, Brando garantiu aos servidores o total apoio da classe dos advogados na luta pelo pagamento dos precatórios alimentares. “Através de nosso ofício, vamos lutar pelos seus direitos e vamos vencer!”, disse o advogado, arrancando aplausos e gritos de apoio dos funcionários públicos.

Emoção

Antônio Pattaro Filho, um professor aposentado de 70 anos , não resistiu à emoção provocada pelo ato público e começou a chorar feito criança. “É uma injustiça o que estão fazendo com os servidores públicos”, desabafou, referindo-se ao fato de o Governo não cumprir as decisões judiciais que já determinaram o pagamento dos precatórios. Nessa linha, a professora Zilda Halben Guerra, presidente da Associação dos Professores Aposentados do Magistério Público do Estado de São Paulo, APAMPESP, lembrou que os servidores públicos, quando não saldam suas dívidas, recebem um tratamento desigual em relação ao Estado. “Nós, servidores, se deixamos de pagar as contas de luz ou telefone, somos punidos. Já o Estado, embora pratique o calote oficial, não é penalizado” A aposentada Alayde Mendes Pinto, por exemplo, tem R$ 10 mil a receber da Prefeitura, em ação julgada favorável desde 1995. “Não tenho dinheiro nem para comprar meu aparelho auditivo”, lamenta a aposentada, que teve o serviço de telefone fixo cortado devido à inadimplência. Em tom de protesto, a professora Zilda também fez um alerta ao governador do Estado, Geraldo Alckmin: “Governador, o aposentado tem pressa. Não pode receber depois de morto!” Em seguida, Lineu Neves Mazano, presidente da Federação dos Sindicatos dos Servidores Públicos no Estado de S.P, resumiu em uma frase o objetivo principal do ato público: “Estamos exigindo, apenas, o respeito ao cidadão. Afinal, o precatório alimentar não é um benefício, e sim um direito dos servidores públicos”.

Marcha

Por volta das 16h, uma hora e meia após o início da manifestação, os servidores decidiram marchar em direção à Praça João Mendes – onde estão localizados o Tribunal de Justiça do Estado e o Fórum João Mendes – para reforçar o protesto. Embalados pelas marchinhas de uma bandinha tradicional, formada por seis integrantes, eles seguiram o carro de som até chegar ao local. Durante o trajeto, Flávio Brando, presidente da Comissão de Precatórios da OAB, explicou aos paulistanos o motivo da passeata. Até aquele momento é de se supor que boa parte deles nunca ouvira falar de precatório. Por isso, pararam para ouvir as palavras de Brando. “Os precatórios alimentares são dívidas trabalhistas do Governo com o funcionalismo público. Tratam-se, na verdade, de um direito humano, pois servidores estão morrendo por não receber o que têm direito”.

Praça João Mendes

Ao chegar à praça, o carro de som estacionou entre o Tribunal de Justiça e o Fórum João Mendes. A esta altura, os servidores voltaram a erguer uma série de faixas nas quais demonstraram sua insatisfação com as administrações municipal e estadual. Em uma delas registrava-se o protesto: NÃO AO CALOTE OFICIAL! PELO PAGAMENTO DO PRECATÓRIO ALIMENTAR Noutra, mais contundente, havia o seguinte recado ao governador do Estado, Geraldo Alckmin:

Aposentados querem PRECATÓRIOS EM VIDA

Ao final da manifestação, os servidores públicos combinaram que, a partir daquele momento, vão se manter em Assembléia Permanente e, sempre que houver uma aparição pública da prefeita ou do governador do Estado, estarão presentes para pressioná-los a pagar o que devem.

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