Doentes e idosos devem ter preferência

Após a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 62, as regras para o pagamento dos precatórios – dívidas dos entes públicos com pessoas físicas ou jurídicas – foram alteradas. Em relação às dívidas de natureza alimentar – aquelas referentes a diferenças salariais de servidores públicos – a nova regra estabelece que os idosos e os portadores de doenças graves devem ter preferência. Esse é o tema do artigo escrito pelo advogado Cláudio Sérgio Pontes, sócio da Advocacia Sandoval Filho. Leia a íntegra.

Diante da entrada em vigor da Emenda Constitucional n° 62/09, tornam-se necessárias medidas práticas para a efetividade da atual regra jurídica que dá a possibilidade de um regime especial para pagamento dos precatórios.

Ressalta-se que a Emenda Constitucional nº 62/09, em alguns aspectos, alterou definitivamente a regra dos precatórios à luz do artigo 100 da Carta Magna e, sob outros enfoques, em caráter transitório, possibilitou ao devedor um regime especial para quitar a dívida (art. 97 do ADCT).

Em razão do novo regime instituído, o Estado de São Paulo passará a disponibilizar para pagamento de precatórios judiciais 1,5% da receita corrente líquida. Deste valor, 50% serão destinados ao pagamento de acordo com ordem cronológica do precatório, com preferência ao alimentar e observância das prioridades estabelecidas na legislação em questão.

A outra metade dos recursos (50%), a critério de conveniência do governador do Estado, poderá ser utilizada para pagamento dos precatórios mediante leilão, acordos em câmara de conciliação ou por ordem crescente de valor.

Alterações realizadas pela Emenda

A primeira alteração relevante no sistema de pagamento de precatório diz respeito à gestão dos recursos destinados ao pagamento dessas dívidas. No que tange ao regime especial os recursos disponibilizados pelo executivo para adimplemento dos precatórios deverão ser depositados em contas especiais, que serão executadas pelo Tribunal de Justiça.

Assim, no Estado de São Paulo, a primeira medida efetiva do Presidente do Tribunal de Justiça, em respeito à sua responsabilidade funcional, foi indicar aos entes devedores as contas especiais nas quais os depósitos devem ser realizados.

No entanto, a providência não resolve a questão, pois o ato do Poder Executivo em disponibilizar o recurso em conta especial não é suficiente para efetivação do pagamento, que ainda dependerá de estruturação das novas listas de ordem, respeitando preferência, antiguidade e natureza do precatório.

Alerta-se que a insuficiência de recursos financeiros para liquidação imediata de todos os precatórios dos credores preferenciais não impede o início do pagamento obedecendo rigorosamente a ordem constitucional, apesar da inexistência de estrutura adequada.

Portanto, o cumprimento da regra constitucional deve se iniciar pelo pagamento aos credores alimentares portadores de doença grave ou com sessenta anos ou mais, por ordem de antiguidade de precatório.

Outra questão relevante na Emenda Constitucional nº 62/09 é a que possibilita a utilização de até 50% dos recursos para cumprimento de precatório por leilão, ordem crescente de valor ou conciliação.

O Governo do Estado, no Decreto Estadual nº 55.300/09, ressalvou que a forma de utilização desse percentual do recurso será informado oportunamente, a critério de sua conveniência.

Preferências

O ordenamento constitucional estabelece prioridade ao pagamento de precatório de natureza alimentícia em decorrência de idade, com 60 anos ou mais, e de doença grave. A princípio denotam-se prioridades absolutas que, entre elas, será necessário estabelecer uma ordem, vez que o recurso disponível não será suficiente para atender a demanda.

A Emenda estabelece que portadores de doença grave, definidas em lei, terão preferência ao pagamento do precatório alimentar até o limite do triplo fixado para o crédito de pequeno valor, que é de R$ 18.641,43.

Enquanto não houver lei específica para definir “doenças graves”, é perfeitamente razoável a aplicação do disposto na Lei Federal nº 7.713/88, que em seu artigo 6º, inciso XIV, apresenta rol de doenças consideradas graves para fins de isenção tributária.

No entanto, outras hipóteses não abrangidas na legislação e não reconhecidas administrativamente poderão ser tratadas diretamente nos autos da execução, mediante provocação da parte, com comprovação da existência da enfermidade. Se houver convencimento do Juízo, ele poderá requisitar a inclusão na lista de pagamento com preferência sobre todas as demais hipóteses, por ordem de antiguidade na eventual escassez de recurso.

Outra situação a ser observada diz respeito à preferência dos credores alimentares portadores de doença grave em relação aos idosos. Por se tratar de expectativa de vida, é razoável que o portador de doença tenha preferência ao de idade independentemente da antiguidade do precatório.

O critério da idade é estritamente objetivo: o credor deve ter 60 anos ou mais até a data da promulgação da Emenda, nos casos dos precatórios vencidos, ou até a data da expedição, nos futuros.

Acrescente-se que o benefício da preferência no pagamento poderá ser extensível aos sucessores, desde que o credor originário preencha os requisitos de idade ou doença à época de sua morte.

Portanto, numa interpretação sistemática é possível extrair a seguinte ordem de pagamento:

1º credor alimentar portador de doença grave, por ordem de apresentação de requisição judicial que reconhece tal prioridade ou antiguidade de precatório quando já reconhecido administrativamente;

2º credor alimentar com sessenta anos ou mais, por ordem de antiguidade do precatório;

3º ordem cronológica de apresentação do precatório com preferência ao alimentar para os precatórios do mesmo ano.

Obrigações de Pequeno Valor

O texto constitucional é cristalino no sentido de que a opção pelo regime especial de pagamento de precatório não inclui o crédito de pequeno valor, que, portanto, continua a ser regulamentado, no âmbito do Estado de São Paulo, pela Lei Estadual nº 11.377/03.


Cláudio Sérgio Pontes tem 38 anos e é advogado especializado na defesa do servidor público, sócio da Advocacia Sandoval Filho.

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